O ministro Gilmar Mendes votou, na sessão desta terça-feira (27) da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, pela incompetĂȘncia do juĂzo da 7ÂȘ Vara Criminal Federal do Rio de Janeiro, para processar e julgar ações penais provenientes das investigações da Operação Esquema S, que apura a suposta prĂĄtica de trĂĄfico de influĂȘncia e desvios no Sistema S. Segundo o relator da Reclamação (RCL) 43479, a jurisprudĂȘncia do Supremo prevĂȘ a competĂȘncia da Justiça estadual para processar e julgar ação em que se discuta a ocorrĂȘncia de irregularidades em entidades do Sistema S.
O julgamento foi suspenso por pedido de vista do ministro Nunes Marques.
Desvios
O esquema investigado envolve supostos desvios de recursos da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado do Rio de Janeiro (Fecomércio/RJ), do Serviço Social do Comércio (Sesc/RJ) e do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac/RJ) e a prĂĄtica de crimes de peculato, estelionato e trĂĄfico de influĂȘncia, a partir de exigĂȘncias de valores pelos advogados denunciados, sob o pretexto de obtenção de vitórias judiciais no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no Tribunal de Contas da União (TCU).
Usurpação de competĂȘncia
Na Reclamação, os conselhos seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Distrito Federal, de São Paulo, de Alagoas e do Rio de Janeiro questionam ato do juiz Marcelo Bretas, titular da 7ÂȘ Vara Criminal Federal do Rio de Janeiro, que teria usurpado a competĂȘncia constitucional do STF, ao homologar o acordo de colaboração premiada celebrado entre o Ministério PĂșblico Federal e Orlando Santos Diniz, ex-presidente da Fecomércio-RJ.
A OAB sustenta que parte dos documentos apresentados pelo colaborador indicaria a prĂĄtica de possĂveis ilĂcitos por detentores de foro por prerrogativa de função no Supremo. Com base neles, Bretas ordenou, no inĂcio de setembro, o cumprimento de 75 mandados de busca e apreensão em empresas, escritórios e residĂȘncias de advogados.
Em 3/10/2020, o relator concedeu medida liminar para suspender a ação penal, o pedido de busca e apreensão e todos os demais processos e medidas cautelares correlatas em tramitação na 7ÂȘ Vara Criminal Federal.
IncompetĂȘncia
Em seu voto, o ministro Gilmar Mendes, após o integral conhecimento dos termos do acordo de colaboração premiada de Orlando Diniz, concluiu pela ausĂȘncia de elementos suficientes de usurpação da competĂȘncia do Supremo. Segundo o relator, os anexos da colaboração que tratavam de autoridades nessa condição foram excluĂdos depois da remessa e da rejeição desses termos pela Procuradoria-Geral da RepĂșblica.
Sistema S
No entanto, para Mendes, outros elementos demonstram a incompetĂȘncia do JuĂzo da 7ÂȘ Vara Criminal Federal do Rio de Janeiro para processar os fatos em questão. Ele observou que, nos termos da jurisprudĂȘncia do Supremo, a Fecomércio e as demais entidades do denominado Sistema "S" não estão sujeitas à competĂȘncia da Justiça Federal (SĂșmula 516), pois são pessoas jurĂdicas de direito privado dotadas de recursos próprios, que não integram os bens ou o patrimônio da União.
Prevenção
O relator também não constatou a alegada competĂȘncia por prevenção do JuĂzo da 7ÂȘ Vara Criminal Federal do Rio de Janeiro. Para ele, o fato de a polĂcia judiciĂĄria ou o Ministério PĂșblico Federal denominarem determinadas apurações como fases da Operação Lava Jato, a partir de uma sequĂȘncia de investigações sobre crimes diversos, não se sobrepõe às normas disciplinadoras de competĂȘncia.
Ainda, de acordo com Mendes, a jurisprudĂȘncia do Supremo jĂĄ pacificou o entendimento de que a colaboração premiada não é critério definidor da competĂȘncia e que fatos dotados de evidente autonomia delitiva e probatória devem ser submetidos à livre distribuição.
Pescaria probatória
Outra situação de flagrante ilegalidade apontada pelo relator se refere às medidas de busca e apreensão deflagradas contra os escritórios de advocacia. Segundo o ministro, as medidas buscaram "pescar" provas contra os denunciados e possĂveis novos investigados e não observou os requisitos legais nem as prerrogativas da advocacia. Na sua avaliação, a não indicação de fundamentos fĂĄticos e jurĂdicos que as justificassem resulta na nulidade da diligĂȘncia e de todas as provas dela decorrentes.
Danos morais coletivos
Também, para o ministro, houve flagrante ilegalidade no bloqueio cautelar de bens para futura reparação de danos morais coletivos. Ele frisou que hĂĄ precedentes da Segunda Turma do STF que entendem ser impossĂvel fixar danos morais coletivos no processo penal, tendo em vista o limitado âmbito de cognição dessa ação para tratar de reparações coletivas.
Leia a Ăntegra do voto do ministro Gilmar Mendes.
SP/AS//CF
Fonte: STF