Combate ao assĂ©dio, o exemplo deve vir do próprio JudiciĂĄrio

Por Redação em 07/10/2021 às 08:44:05

Dados de recente pesquisa realizada no Instituto PatrĂ­cia Galvão mostram que 76% das mulheres jĂĄ sofreram assédio no trabalho. NĂșmeros que se confirmam por registros crescentes junto ao Ministério PĂșblico do Trabalho (MPT), que mensurou um aumento de 64% nas denĂșncias de assédio sexual no local de trabalho no perĂ­odo de 2015 a 2019. Em 8 de março deste ano, a Rede Nossa São Paulo lançou a quarta edição da pesquisa "Viver em São Paulo: mulher", mostrando, entre outros resultados, que 88% das mulheres relataram aumento do assédio e da violĂȘncia em 2021 em relação ao ano anterior.

São muitos os dados, frutos de pesquisas sérias, que nos dão a dimensão de quão arraigada estĂĄ a cultura do assédio moral e sexual de mulheres em todos os segmentos de nossa sociedade. Na Justiça brasileira, que não é um feudo nem uma ilha fora da realidade cotidiana, não poderia ser diferente. A diferença é a resposta que se estĂĄ buscando dar a essa prĂĄtica que tem efeitos tão nocivos.

É sabido que dentro de instituições de poder os casos de assédio são preocupantes. Em pesquisa conduzida pelo juiz de Direito Rodrigo Foureaux, 74% das mulheres entrevistadas em ambientes militares afirmam terem sofrido assédio sexual dentro destes órgãos e, aponta ainda, que 83% destas não realizaram denĂșncia por medo de perseguição, de atrapalhar suas carreiras ou ainda por não confiarem nas instituições.

O Poder JudiciĂĄrio é órgão competente por excelĂȘncia para instruir e determinar punição em casos como esses, mas nem por isso devemos supor que somos internamente imunes da ocorrĂȘncia desse tipo de violĂȘncia. De modo que precisamos reconhecer, de uma vez por todas, que nosso papel não é apenas de atuar no resgate dos ideais de justiça no âmbito externo, mas também dentro de nossa própria estrutura. E essa movimentação de membros e órgãos do JudiciĂĄrio vem evoluindo cada vez mais, com destaque para a luta contra a violĂȘncia contra as mulheres.

Nesse particular, é crescente o nĂșmero de ações promovidas ou apoiadas por instituições ligadas ao Poder JudiciĂĄrio na defesa das mulheres, inclusive com provocações junto ao Congresso Nacional para aprovação de importantes leis, como a que regula o Programa Sinal Vermelho contra a ViolĂȘncia Doméstica (Lei nÂș 14.188/21) e a que criminaliza a violĂȘncia polĂ­tica contra as mulheres (Lei nÂș 14.192/21).

No âmbito interno, o Conselho Nacional de Justiça – CNJ, em outubro de 2020, aprovou a Resolução nÂș 351 que instituiu a PolĂ­tica de Prevenção e Enfrentamento ao Assédio Moral, ao Assédio Sexual e à Discriminação dentro do Poder JudiciĂĄrio brasileiro.

No enfrentamento especĂ­fico da violĂȘncia contra as mulheres, as Cortes de Justiça nacionais tĂȘm criado polĂ­ticas internas especĂ­ficas para esse fim, a exemplo da Ouvidoria da Mulher em funcionamento no Tribunal Regional Eleitoral de GoiĂĄs. Trata-se de canal de comunicação exclusivo para que mulheres vĂ­timas de assédio, moral ou sexual, e de discriminação possam fazer suas denĂșncias, sejam elas juĂ­zas, promotoras, advogadas, colaboradoras ou eleitoras, sendo que essas informações serão tratadas apenas por mulheres, que farão o acolhimento da vĂ­tima, com sua escuta ativa, e promoverão os encaminhamentos necessĂĄrios, tanto na parte correicional quanto, inclusive, de apuração criminal.

É urgente que todo o Poder JudiciĂĄrio implemente iniciativas como as Ouvidorias da Mulher, pois só teremos condições efetivas de garantir a igualdade, equidade e isonomia determinadas por nossa Constituição de 1988 quando internamente cumprirmos com nosso dever. Como diria o ditado popular, "o exemplo começa dentro de casa" e esse, tem sido dado!



(*) Tânia Regina Silva Reckziegel é desembargadora do Tribunal Regional do Trabalho da 4ÂȘ Região e conselheira do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e MĂĄrcio Moraes é juiz-membro e ouvidor do TRE-GO.


Fonte: CNJ

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