Restaurante restituirĂĄ a balconista dias não abonados por faltas justificadas para cuidar de bebĂȘ com intolerância à lactose

Por Redação em 08/06/2024 às 15:32:00
De acordo com a decisão, um restaurante da região Centro-Oeste do estado foi condenado a restituir os 15 dias de trabalho não abonados de uma balconista. Ela teve os dias descontados ao ficar afastada do serviço, mediante atestado médico, para cuidar da filha, com problemas de saĂșde relacionados à alergia a suplemento lĂĄcteo.

Segundo a balconista, o afastamento teve inĂ­cio em 13 de junho de 2023. Ela alegou que apresentou o atestado, mas o documento não foi aceito pela empregadora, que acabou promovendo o desconto dos dias respectivos. Por isso, pleiteou a restituição judicialmente.

A empregadora contestou, na defesa, a alegação da profissional, salientando que o atestado não foi apresentado e que sempre abonou as faltas dela no curso do contrato. Destacou ainda que o atestado juntado com a inicial não se refere à saĂșde da própria trabalhadora, mas sim à saĂșde da filha, não podendo, por isso, abonar as faltas daquele perĂ­odo.

Ao decidir o caso, a juĂ­za de 1Âș grau reconheceu que a trabalhadora apresentou atestados médicos em vĂĄrias ocasiões, sendo que, em todas as oportunidades, houve o respectivo abono pela empresa. Constatou ainda que o atestado, datado de 13 de junho de 2023, foi emitido por uma médica pediatra, relatando a necessidade de a reclamante se afastar das atividades laborais, por um perĂ­odo de 15 dias, para suprir as necessidades nutricionais da filha de seis meses de idade.

Segundo a julgadora, impõe-se, a partir da presente hipótese, o julgamento com perspectiva interseccional de gĂȘnero e raça, pautando-se pelo protocolo de julgamento elaborado pelo Conselho Nacional de Justiça, por meio da Resolução 492 de 2023, que estabeleceu diretrizes para adoção por todos os órgãos do Poder JudiciĂĄrio.

"Embora não haja previsão especĂ­fica na CLT sobre a questão, existe normatividade internacional farta a amparar o pleito, seja pela aplicação da Convenção para a Eliminação da Discriminação contra a Mulher (CEDAW); pela Convenção 103 da OIT, denominada Convenção sobre o Amparo à Maternidade, ou pela aplicação do Protocolo 492 do CNJ para Julgamento com Perspectiva Interseccional de GĂȘnero e Raça", ressaltou.

Isso porque, segundo a magistrada, a "perspectiva de gĂȘnero implica reconhecer e considerar as desigualdades e as discriminações em razão do gĂȘnero, notadamente no mundo do trabalho, buscando neutralizĂĄ-las a fim de se concretizar a igualdade substantiva".

Na sentença, a juĂ­za ressaltou considerações da Convenção para a Eliminação da Discriminação contra a Mulher. "Relembrando que a discriminação contra a mulher viola os princĂ­pios da igualdade de direitos e do respeito da dignidade humana, dificulta a participação da mulher nas mesmas condições que o homem, na vida polĂ­tica, social, econômica e cultural do paĂ­s, constitui um obstĂĄculo ao aumento do bem-estar da sociedade e da famĂ­lia e dificulta o pleno desenvolvimento das potencialidades da mulher para prestar serviço ao paĂ­s e à humanidade", diz o texto da Convenção para a Eliminação da Discriminação contra a Mulher, destacado pela juĂ­za.

Quanto à Convenção 103 da OIT de Amparo à Maternidade, a juĂ­za ressaltou na sentença o Artigo III e numerações subsequentes, que preveem o direito à remuneração e amparo à mulher em casos de licença-maternidade e atestados médicos decorrentes de doenças ou cuidados decorrentes da gestação. "Toda a teleologia da norma internacional volta-se a situações relacionadas à maternidade e à proteção contra medidas discriminatórias, especialmente considerado o panorama mundial de divisão sexual do trabalho, cujo ônus recai incontestavelmente sobre a mulher e o dever de cuidado com os filhos", diz o texto da norma.

Para a juĂ­za, o fato é que um bebĂȘ de seis meses é a própria extensão da figura da mãe, porque dependente dela totalmente, especialmente nos casos em que se requer cuidado médico e materno especĂ­fico.

"Não por outras razões, a discriminação agrava-se com maior ĂȘnfase a se considerar a condição social da trabalhadora, cozinheira, pessoa simples e remunerada com valores próximos ao salĂĄrio-mĂ­nimo, que por óbvio não a possibilitam delegar o dever de cuidado com o filho, mediante remuneração de terceiros. Apresenta-se notadamente discriminatória a conduta patronal, a se considerar que, se adoentada, a trabalhadora teria os dias abonados, mas na condição de mãe de recém-nascido teve os dias descontados, mesmo com atestado médico neste sentido. Fica nĂ­tida a dura realidade vivenciada pelas mulheres no mercado de trabalho em razão da maternidade", ressaltou.

No entendimento da magistrada, o atestado médico apresentado pela trabalhadora deve ser lido sob a ótica do Julgamento sob a Perspectiva de GĂȘnero e Raça, sobre o qual uma trabalhadora que, necessariamente, teria os dias abonados por motivo de doença própria, igualmente o terĂĄ pela necessidade especial da filha de seis meses.

"Isso levando em conta o dever de cuidado da mãe e todo o aparato normativo citado, não só de proteção à maternidade, como de formas de eliminação da discriminação contra a mulher, na condição de mãe", concluiu a juĂ­za, condenando o restaurante ao pagamento de 15 dias de trabalho não abonados por atestado médico, no perĂ­odo de 13 a 27/6/2023. HĂĄ recurso aguardando a data de julgamento no TRT-MG.

Fonte: TRT 3ÂȘ Região

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