Para Quinta Turma, in dubio pro societate não resolve dĂșvida sobre dolo eventual na pronĂșncia

Por Redação em 31/10/2023 às 11:38:00
Para a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), havendo dĂșvida sobre a submissão do réu ao tribunal do jĂșri, é possĂ­vel aplicar o preceito in dubio pro societate em relação à materialidade do crime e aos indĂ­cios de autoria; tal preceito, porém, não deve prevalecer quanto ao elemento subjetivo – ou seja, à definição sobre a conduta do réu ter sido dolosa ou culposa.

Com esse entendimento, o colegiado confirmou decisão monocrĂĄtica do relator, desembargador convocado João Batista Moreira, que desclassificou para a forma culposa um crime de trânsito pelo qual o réu havia sido pronunciado, sob a acusação de homicĂ­dios consumado e tentado com dolo eventual.

De acordo com os autos, dirigindo após ingerir bebida alcoólica, o réu invadiu a contramão e colidiu com dois motociclistas – um deles morreu e o outro ficou ferido.

Ao ratificar a sentença de pronĂșncia, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) afirmou que, na primeira fase do procedimento jĂșri, eventual dĂșvida sobre o carĂĄter doloso da conduta não deve favorecer o acusado, devendo prevalecer, nesse caso, a regra in dubio pro societate. No entendimento do tribunal, bastam a prova de materialidade e indĂ­cios suficientes de autoria – além de uma compreensão preliminar sobre a ocorrĂȘncia de dolo eventual – para que o processo seja julgado pelo jĂșri popular.

No entanto, segundo o relator no STJ, mesmo que não se conclua pela aplicação do princĂ­pio in dubio pro reo – que tem amparo constitucional – na fase de pronĂșncia, "no mĂ­nimo deve-se entender que o interesse maior da sociedade é a realização da justiça. E não serĂĄ a melhor maneira de promover justiça a remessa, ao tribunal do jĂșri, do julgamento de questão relacionada à configuração, ou não, de dolo eventual, com tantas nuances fĂĄticas e teóricas".

Embriaguez não leva ao reconhecimento automĂĄtico de dolo
O desembargador João Batista Moreira destacou que, segundo o artigo 28, inciso II, do Código Penal, a embriaguez não exclui a imputabilidade penal, mas isso não significa que o dispositivo leve, necessariamente, ao reconhecimento do dolo.

"Entender que a conduta de embriagar-se implica, em todos os casos, assunção do risco e a aceitação (remota) da possibilidade do cometimento, em seguida, de atos criminosos seria levar a indevido extremo a teoria da actio libera in causa. À luz desse pressuposto, deve ser examinado, pois, se mesmo que reconhecida a presença de prova ou indĂ­cios de embriaguez, as demais circunstâncias fĂĄticas autorizam concluir que o réu, no momento imediatamente anterior, assumiu o risco de produzir e assentiu no resultado criminoso", declarou.

O relator apontou que algumas informações do processo precisariam ser levadas em conta, como o fato de que chovia na hora da colisão, o local – onde jĂĄ houve acidentes semelhantes – era uma curva inclinada, a pista era autorizada para 40 km/h e o réu dirigia entre 43 e 48 km/h. Além disso, ele prestou socorro às vĂ­timas e entrou em contato com a polĂ­cia, "o que denota, salvo a desarrazoada hipótese de imediato arrependimento, ausĂȘncia de prévio consentimento com o resultado".

Na opinião de João Batista Moreira, o artigo 419 do Código de Processo Penal leva à conclusão de que não bastam as provas de crime contra a vida e os indĂ­cios de sua autoria para que o caso vĂĄ ao jĂșri. "Do contrĂĄrio, todos os crimes contra a vida, evidenciada a respectiva materialidade e autoria, independentemente da forma dolosa, deveriam ser remetidos ao tribunal popular, competindo a este e só a este, pois, a eventual desclassificação para a forma culposa", ponderou.

Para o relator, cabe ao juiz, em relação ao elemento subjetivo, "sopesar as provas e circunstâncias e decidir, fundamentadamente, quanto à hipótese de desclassificação para a forma culposa".

Fonte: STJ

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